Durante anos a fio, sempre que nos referíamos à importância de conhecer a “história” e de procurar perceber os movimentos da “geopolítica internacional”,
Paulo Ramalho
Vereador da CM Maia
Durante anos a fio, sempre que nos referíamos à importância de conhecer a “história” e de procurar perceber os movimentos da “geopolítica internacional”, éramos frequentemente ouvidos com pouca atenção.
Recordo-me a propósito, das primeiras conferências sobre temas da realidade internacional que promovemos na Câmara Municipal, aliadas à “World Press Photo”. Por ali passaram nomes como Azeredo Lopes, José Manuel Félix Ribeiro, Paulo Rangel, Bernardo Ivo Cruz, Carlos Branco, Ana Isabel Xavier, Raquel Vaz Pinto, Henrique Burnay, Bruno Cardoso Reis, Sandra Fernandes, Fernando Jorge Cardoso e muitos outros que vemos frequentemente nos últimos meses (alguns mesmo quase todos os dias…) a comentar os desenvolvimentos da guerra na Ucrânia nos diversos canais de televisão. Falamos do crescimento e da estratégia da China, da primavera árabe, do crescimento dos movimentos de extrema-direita, dos desafios da União Europeia, da Agenda 2030, dos atentados terroristas, do Brexit, da importância das eleições americanas, das consequências da pandemia e de muitos outros assuntos que normalmente não mobilizam a especial atenção da maioria dos cidadãos, mas que num mundo fortemente globalizado e interdependente, sabemos bem que acabam sempre por influenciar as nossas vidas, provocar e acelerar mudanças, independentemente da nossa vontade ou grau de perceção.
Por outro lado, nunca tivemos dúvidas, que em tempos de grande volatilidade e incerteza, de constantes mudanças, como aqueles que têm caracterizado estas duas últimas décadas, a capacidade de antecipar está sempre ligada ao maior conhecimento da realidade e de toda a sua envolvência. E mesmo assim, podemos sempre ser surpreendidos com algo absolutamente imprevisível, como aconteceu em 2020 com a pandemia por Covid-19, que de um momento para o outro quase paralisou o mundo.
Ora, hoje, com a guerra na Ucrânia, voltamos todos a prestar mais atenção à história, à II Guerra Mundial, à queda do Muro de Berlim e da União Soviética, ao fim da Guerra Fria, e até ouvimos falar novamente de “czares” e do “Império Russo”. Até já percebemos de misseis e drones, e voltamos a falar do risco de uma guerra nuclear. Mas mais, para além de termos concluído que a paz na Europa afinal não era um dado adquirido, estamos todos a constatar que a guerra entre dois países no centro da Europa está a provocar graves danos nas nossas vidas, nós simples cidadãos, nós instituições, nós empresas, que até estamos bem distantes do local onde se desenvolve o conflito.
O custo da energia, dos combustíveis, das matérias-primas e dos alimentos não param de subir. A tendência inflacionista que já se vinha sentindo no último semestre do ano passado ganhou tal impulso com a guerra na Ucrânia, que nesta altura já atinge cerca de 10% na Europa. O próprio Banco Central Europeu viu-se “obrigado a subir as taxas de juro” e os nossos empréstimos ficaram mais caros, quando ainda há bem pouco tempo ouvíamos falar de taxas de juro negativas…
Planear com esta volatilidade, insegurança e incerteza é nesta altura um exercício quase impossível, quer para as empresas, quer para as famílias. O índice de imprevisibilidade é muito elevado.
Por outro lado, nós que estávamos a voltar à normalidade e ao crescimento económico depois de finda a pandemia, estamos novamente a caminho da recessão. A Alemanha, a economia mais forte da União Europeia, já o admitiu.
Não tenho dúvidas das dificuldades dos tempos que vivemos, e é bem possível que o pior esteja ainda para vir. Ninguém sabe ao certo quando terminará, e como terminará este conflito entre a Federação Russa e a Ucrânia.
Na verdade, não me parece que esta guerra se resuma apenas à disputa e domínio sobre os territórios da Crimeia e do Donbass ou ao acesso ao Mar Negro, mesmo que animada por questões relacionadas com o fornecimento de gás e petróleo…
Mas há algo de que tenho a certeza, não podemos vacilar na defesa dos nossos valores, na defesa da dignidade da pessoa humana e do respeito pelo direito internacional.
Sendo que terminada esta guerra, teremos seguramente mudanças na geopolítica mundial, nas relações de poder e na geometria económica. E se a pandemia acelerou a transição digital, esta guerra vai no limite, acelerar a transição energética…
Edição 2022
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