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O ambiente fortemente competitivo que se vive na disputa pela atração de visitantes, residentes e investimento, tem impulsionado as cidades a

Filipe Gonçalves

Managing partner da Strategy XXI, Consultor em estratégia

Made by: o “poder” das empresas (e das pessoas) na criação da ” marca cidade”

O ambiente fortemente competitivo que se vive na disputa pela atração de visitantes, residentes e investimento, tem impulsionado as cidades a adotarem abordagens de marketing semelhantes às utilizadas no domínio dos bens e serviços. A gestão da marca é uma dessas abordagens, sendo claro que num mundo globalizado e em rede, cada cidade tem de competir com todos as outras pela sua quota de consumidores, turistas, empresas, investimento, capital, atenção e reconhecimento.

A marca cidade é o elemento que reúne pessoas, recursos e eventos, numa estratégia que trata as partes como um todo. Assim, a marca deverá atestar a diferenciação do território, mas funcionar também como elemento de identificação, reconhecimento e unidade.

Hoje, podemos argumentar que a imagem que projetamos de uma cidade, pode ser mais importante do que a realidade da cidade em si. Assim, a marca cidade estará sempre algures entre a razão e a emoção no que se refere à formação de opinião dos turistas, investidores e dos próprios habitantes.

Uma das características de qualquer território, é o facto de ser detentor de um nome cuja origem se perde, muitas vezes, no tempo. Este nome, por norma, acaba por ser parte integrante da marca. Não poderemos, por isso, esquecer que este desencadeia junto dos potenciais consumidores, um conjunto de emoções e opiniões, relativas ao conhecimento que têm desse território. Por norma, essa imagem já formulada na nossa mente, resulta da perceção que temos das “gentes da terra”, dos seus feitos, das empresas instaladas, dos seus recursos, de eventos, etc.

Se o objetivo de criar uma marca é vender, no caso da marca cidade, estaremos a falar de vender cidades. E se as cidades são compostas, entre outros aspetos, pelas suas empresas, poderemos afirmar que os consumidores que “comprarem” a nossa cidade, estarão também a “comprar” as nossas empresas. Ou seja, isoladamente ou no seu conjunto, as empresas instaladas numa cidade, contribuem positiva ou negativamente para a imagem que temos desse território. Assim, a imagem de uma cidade dependerá, pelo menos em parte, da imagem transmitida pelas empresas que aí se encontram.

Terão, então, as empresas um impacto assim tão grande na definição e valorização da marca cidade?

Vejamos, por exemplo, o caso de Detroit. Durante anos, a capital mundial da indústria automóvel teve um crescimento económico inigualável, chegando a ser quarta maior cidade dos EUA. E se esse feito se deve à indústria automóvel, este setor foi também o responsável pela sua queda. Os processos de falência (pós subprime) da GM e da Chrysler e o processo de recuperação da Ford, levaram a uma forte redução das suas estruturas e a um êxodo populacional de dimensões catastróficas. Em poucos anos, Detroit viria a ser a maior cidade norte-americana a declarar falência, com dívidas superiores a 15 mil milhões de euros.

Este processo, levou a um acelerar da degradação das infraestruturas públicas e ao abandono de mais de 80 mil propriedades que viriam a ser vandalizadas e/ou ocupadas ilegalmente. Esta imagem, levou a que ainda mais pessoas abandonassem Detroit, a uma enorme desvalorização do mercado imobiliário e à criação de uma imagem negativa e de consequente desinteresse pelo território.

Mas quando falamos do contributo que as empresas têm na criação da marca cidade (estado ou país), nem sempre é necessário que a “força de produção” se encontre aí instalada, como acontecia em Detroit com a indústria automóvel. A globalização, veio alterar por completo os mercados e a forma como as empresas se organizam e se por um lado, desconfiamos da qualidade dos produtos chineses, por outro, veneramos e confiamos nos produtos Apple, mesmo sabendo que a sua assemblagem é feita na china. Tal como compramos as malhas das marcas de alta costura que nos chegam da Índia. Ou a lingerie feita no Sri Lanka com algodão do Burkina Faso.

O “Designed by Apple”, “Engineered by Mercedes” ou o “Savoir-faire da Louis Vuitton”, dão-nos confiança suficiente para não pormos em causa (e por vezes nem sabermos) o local onde estes são produzidos e isso faz com que associemos, naturalmente, a Califórnia à tecnologia, a Alemanha à qualidade automóvel ou Paris à capital da moda.

Deixamos assim, de dar importância ao “made in” para valorizar e avaliar o “made by”. E este “made by” influencia não só a nossa opinião enquanto consumidores dos produtos concebidos num determinado território, mas também o processo de decisão de investidores, quando procuram locais para instalar as suas empresas. Se pretendemos mão de obra altamente qualificada em engenharia automóvel, certamente que teremos maior facilidade em encontrar recursos na Alemanha do que no Peru e isso irá pesar no processo de decisão.

Mas funcionará o “made by” por si só ou depende de estratégias concertadas e de políticas públicas orientadas para a dinamização económica?

Estaremos todos de acordo, que nada acontece por acaso e a construção do “made by” leva anos e depende da visão, da audácia, da persistência e, sobretudo, do alinhamento dos vários stakeholders.

No domínio público, a implementação de programas de inovação e criatividade nas escolas, será fundamental para fomentar o empreendedorismo a médio e longo prazo. A disponibilização de estruturas de incubação e aceleração, permitirão manter no território as boas ideias, os melhores profissionais e afirmar a identidade da cidade. A diplomacia económica e o apoio no acesso aos mercados internacionais, será de extrema importância para promover o tecido empresarial local. Uma estrutura profissional e dedicada à dinamização económica e à promoção da marca cidade será a base para o sucesso desta estratégia.

A atração de investimento sem estratégia, exige, muitas vezes, um elevado e desmedido investimento público. Evoluir do “made in” para o “made by”, pressupõe um investimento público racional e planeado.

Investimento na qualificação dos profissionais, na disponibilização das infraestruturas adequadas, na mobilidade e acessibilidade ao território, na regeneração urbana, na qualidade de vida e no ambiente. Pressupõe, por isso, investimento nas pessoas!

Edição 2016